Governador Tarcísio de Freitas exclui carros e ônibus elétricos de benefícios de IPVA em São Paulo em favor de poluidores

CLEMENTE GAUER

No dia 10 de dezembro, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) aprovou, por 53 votos favoráveis e 12 contrários, a PL 1510 proposta pelo governador Tarcisio Freitas, com apoio do Secretário da Fazenda e Planejamento, Samuel Kobayashi. Em contrapartida, o vereador Antonio Donato — que vem defendendo avanços na eletromobilidade e incentivos reais à transição energética — já demonstrou que existem caminhos mais eficazes para acelerar a adoção de soluções verdadeiramente sustentáveis na frota veicular paulista. Infelizmente, a decisão tomada pela ALESP vai na contramão dessas propostas, reforçando um modelo de mobilidade que não promove a verdadeira descarbonização, ao excluir veículos elétricos e ônibus elétricos de benefícios que poderiam impulsionar a adoção em larga escala dessas tecnologias limpas.

Principais pontos de preocupação:

1. Falsa promessa de descarbonização:

Embora a proposta oficial desta gestão ressalte a sustentabilidade, os híbridos flex não garantem o uso efetivo do etanol. Atualmente, cerca de 70% dos carros flex continuam rodando majoritariamente com gasolina, conforme estudo publicado pela Folha de S. Paulo (mar/2024) e dados da União dos Produtores de Bioenergia (UDOP). Ao incentivar essa tecnologia, a PL 1510 perpetua a dependência de combustíveis fósseis, adiando a redução real das emissões.

2. Renúncia fiscal a veículos ainda poluentes:

A nova lei equipara veículos micro-híbridos — com ganhos ambientais mínimos — a híbridos mais robustos e até a carros elétricos puros. Segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), os micro-híbridos já vendem mais que os híbridos não-plug-in, indicando que o incentivo fiscal favorecerá prioritariamente modelos de baixo impacto ambiental, minando a pretensa descarbonização.

3. Desperdício do potencial energético e agroindustrial do estado:

São Paulo produz 27,36% de sua energia elétrica a partir da biomassa da cana, fonte capaz de impulsionar a eletrificação da frota (BEVs) e gerar até 40% do lucro das usinas via cogeração, conforme Newton Duarte da COGEN. Ao privilegiar híbridos flex, a PL 1510 ignora a oportunidade de fortalecer a indústria local de energia limpa, dinamizar a cadeia produtiva e posicionar São Paulo na vanguarda tecnológica da mobilidade sustentável.

4. Dependência continuada da gasolina:

Manuais de montadoras como Toyota e Stellantis recomendam abastecer o tanque com gasolina a cada 10.000 km, mesmo para quem roda majoritariamente com etanol. Na prática, os híbridos não rompem com a lógica do combustível fóssil. Enquanto isso, veículos 100% elétricos poderiam operar apoiados em uma matriz cada vez mais limpa, reduzindo drasticamente as emissões ao longo do seu ciclo de vida.

5. Evidências científicas a favor do elétrico:

Estudos do International Council on Clean Transportation (ICCT) mostram que, graças à matriz elétrica brasileira, BEVs emitem cerca de um terço das emissões dos veículos flex. Com avanços futuros, podem se aproximar de emissões quase nulas. Ao aprovar a PL 1510, a ALESP ignora evidências robustas a favor da eletrificação plena.

6. Incentivo a montadoras de fora do estado com tecnologia pouco eficaz:

Ao oferecer benefícios a híbridos leves e micro-híbridos, a PL 1510 incentiva montadoras estabelecidas fora de São Paulo, como a Stellantis, que lançou recentemente os modelos Fastback e Pulse micro-híbridos. Esses veículos apresentam ganhos ambientais limitados, não fortalecendo o ecossistema de inovação local e desviando o estado da rota rumo a soluções mais limpas e avançadas.

7. Exclusão de ônibus elétricos e impacto na qualidade do ar e saúde pública:

Os ônibus, responsáveis por cerca de 47% da poluição do ar na capital paulista, poderiam ser rapidamente substituídos por frotas 100% elétricas, reduzindo drasticamente as emissões urbanas. De acordo com estudos do Instituto Saúde e Sustentabilidade (ISS), a poluição do ar no Estado de São Paulo está associada a milhares de mortes prematuras por ano, além de altos custos ao sistema de saúde devido a doenças respiratórias e cardiovasculares. A substituição de ônibus a diesel por modelos elétricos poderia atenuar esses impactos imediatamente, melhorando a qualidade de vida da população. Entretanto, a PL 1510 deixa de fora incentivos claros aos ônibus elétricos, desperdiçando a oportunidade de reduzir drasticamente a poluição urbana e seus efeitos nocivos à saúde.

8. Contradição com o liberalismo econômico pregado pelo governador:

O governador Tarcísio Gomes de Freitas, oriundo do Partido Liberal (PL), sempre pregou o liberalismo econômico, que pressupõe menor intervenção do Estado e a autorregulação de mercados. Porém, a PL 1510 faz exatamente o oposto ao escolher “vencedores” e “perdedores” no mercado automotivo, concedendo benefícios a tecnologias intermediárias e menos sustentáveis em detrimento de soluções mais limpas e eficientes. Essa postura contradiz o discurso liberal, pois impõe um direcionamento político no mercado, ao invés de permitir que a própria dinâmica econômica e a inovação tecnológica guiem o rumo do setor automotivo.

Conclusão:

A aprovação da PL 1510 é um equívoco no momento em que São Paulo poderia liderar a mobilidade limpa no Brasil. Enquanto iniciativas como as do vereador Antonio Donato apontam para um futuro de inovação, descarbonização e pleno aproveitamento da matriz energética paulista, a decisão da ALESP, sob a proposta do governador Tarcísio Gomes de Freitas, nos afasta desse horizonte.

A sociedade paulista merece políticas efetivamente sustentáveis, que modernizem o setor automotivo, protejam o meio ambiente, fortaleçam a economia local e incluam, de forma explícita e consistente, carros e ônibus 100% elétricos nos benefícios. Infelizmente, no dia 10 de dezembro, o que se viu foi a escolha por um caminho que subestima o potencial do estado, desconsidera o interesse público e ignora o impacto real na saúde e bem-estar da população.

Se São Paulo é uma locomotiva, ela continua sendo uma velha Maria fumaça.

Fontes:
https://www1.folha.uol.com.br/amp/mercado/2024/03/carros-flex-sao-maioria-no-brasil-mas-so-30-da-frota-usa-etanol-diz-estudo.shtml

https://abve.org.br/abve-data/bi-frotas/

https://www.gov.br/aneel/pt-br/centrais-de-conteudos/relatorios-e-indicadores/geracao
https://www.portosenavios.com.br/noticias/geral/ate-2026-sol-e-vento-moverao-mais-241-usinas

https://media.toyota.com.br/43186da9-4047-4653-98c7-c6a25f76c239.pdf
https://servicos.fiat.com.br/content/dam/fiat/products/handbooks/376/2025/handbook-fastback-2024_2025.pdf

https://theicct.org/publication/comparacao-das-emissoes-de-gee-ao-longo-do-ciclo-de-vida-de-motores-de-combustaoflex-e-eletricos-veiculos-de-passageiros-brasil-oct23/
https://theicct.org/riscos-da-aposta-em-carros-hibridos-plug-in-flex-fuel-brasil-jan24/

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